Sucesso das redes sociais, Memes ganham memeday e disciplina acadêmica


Os memes, aquelas imagens e textos geralmente engraçados que aparecem com frequência na timeline das suas redes sociais e te incitam a curtir e compartilhar, agora têm sua própria data comemorativa: 13 de maio. O surgimento do chamado “meme day” veio a reforçar ainda mais o sucesso absoluto que são os memes no mundo virtual. No entanto, segundo Viktor Chagas, professor do Departamento de Estudos Culturais e Mídia da Universidade Federal Fluminense, o meme não é uma criação tão recente quanto parece.
Meme (Foto: Reprodução/Google)Alguns memes que bombaram na web (Foto: Reprodução/Google)
O conceito original surgiu nos anos 70 através de um estudo feito pelo etólogo britânico Richard Dawkins. Como ele usou o termo associado largamente a ideia de difusão ao longo do tempo, houve uma apropriação da ideia nas mais distintas áreas. A ligação atual do conceito de meme à conteúdo online replicado teve origem nos anos 90, embora a explosão de fato tenha sido no início dos anos 2000. Apesar do entendimento dessa ideia pela maioria, “não existe consenso sobre o que é um meme”, afirma o profº. drº. Viktor Chagas.
Segundo o professor, muitos estudiosos do campo da memética consideram o meme de uma forma mais ampla; mas há aqueles que, por exemplo, dissociam o “meme” da ideia de “viral”, acreditando que o primeiro exige uma intervenção criativa do indivíduo, enquanto o segundo seria apenas um compartilhamento em seu formato de origem, sem interferências posteriores.
Até mesmo as características mais básicas consideradas na ideia original são questionáveis no entendimento de meme que temos hoje. Se antes acreditava-se que um meme, entre outras questões, para assim ser considerado precisava ser longevo e atravessasse gerações, hoje isso não faz mais sentido, uma vez que a efemeridade é um traço constante nos memes de sucesso.
Até mesmo as características estéticas são difíceis de definir, já que um meme pode ser uma imagem, uma legenda, um vídeo, uma hashtag, ou até mesmo um comportamento. Não há número de compartilhamentos limite ou qualquer outro parâmetro capaz de medir o que é um meme e o que não é.
Rapaz Ridiculamente Fotogênico foi um dos memes mais bombados do ano passado (Foto: Reprodução)Rapaz Ridiculamente Fotogênico foi um dos memes mais bombados do ano passado (Foto: Reprodução)
Embora a definição ainda pareça turva, o sucesso deles é inegável, e isso pode ocorrer , entre outras razões, pelo fato dos memes representarem uma nova forma de cultura popular na Internet. A universalização da linguagem memética tem ganhado espaço na cultura mainstream, e isso é notável por conta da expansão do número de personagens criados, das camisas estampadas com seus desenhos e frases conhecidas, ou pela crescente viralização facilitada pelas redes sociais.
A produção de memes é algo espontâneo e, por isso, não existem locais para criá-los especificamente. Algumas empresas até tentam emplacar um meme “fabricado”, mas até então se desconhece o êxito nesse tipo de iniciativa. O que existe, de fato, são comunidades que desenvolvem memes coletiva e anonimamente, como é o caso do 4chan. Os famosos Lolcats e Rage Comics (Troll Face e Forever Alone, por exemplo) surgiram nessa que é a maior comunidade do mundo na área de meme. Como Viktor afirma, "4chan cria tendências".
Lolcats (Foto: Reprodução/Google)O fofo e divertido Lolcat. (Foto: Reprodução/Google)
Mesmo com uma produção mundial tão famosa, o produtor ainda é uma incógnita. Não há um perfil definido do internauta que cria memes, só um estereótipo nada concreto. A sociedade absorveu a imagem do mini-hacker, do troll de internet, e  é comum associarmos a figura do produtor de memes a de um garoto de uns 15 anos, proveniente de classe média, e que passa o dia inteiro no quarto, mas isso não necessariamente condiz com a realidade.
De acordo com Viktor, cada meme tem um perfil de produtor/consumidor diferente. O lolcats geralmente é feito por mulheres mais velhas que gostam de gatos e de coisas fofas, o tumblr já é proveniente de um perfil mais universitário, feminino, considerado hipster; e essas são apenas ideias vagas e altamente flexíveis.

Memes no Brasil
Apesar dos memes terem conquistado os brasileiros, Viktor lembra que a produção nacional ainda é bastante pequena, embora isso não diminua nossa importância na área. Muitos autores estrangeiros, como a americana Heather Host, se propõe a analisar os memes criados em nosso território (caso do "Tenso", "Para nossa Alegria" entre outros de repercussão mundial). Isso se deve pelo fato da participação brasileira nesse espaço ser notória, seja por conta da grande aderência dos internautas, seja pela resignificação que fazemos dos memes produzidos no exterior, como aconteceu no caso do “Whatch Out”, que virou o nosso conhecido “Ui”.
As comunidades e fóruns brasileiros que visam produzir memes ainda são de pouca expressão. O que temos bastante são memes desenvolvidos em sites de nicho (caso do Cersibon e Tiopês), e um número grande de tumblrs (Como Eu Me Sinto Quando e O Que Queremos, por exemplo). Apesar da falta de uma comunidade nacional voltada para esse fim, muitos brasileiros participam ativamente da comunidade internacional 4chan, e ainda há a produção que fazemos e que circula internamente com força, como é o caso do recente Vergonhas do Facebook.
O que queremos (Foto: Reprodução/Facebook)"O que queremos" é um dos mais conhecidos memes brasileiros. (Foto: Reprodução/Facebook)
Uma característica interessante dos memes no Brasil é o apelo grande que há a linguagem. Temos tradição de trabalhar o “internetês” e fazer uso de abreviaturas particulares e troca de letras na produção memética. Segundo Viktor, essa particularidade começou a ser desenvolvida ainda nos fóruns das comunidades da rede social Orkut, e de lá para cá tem expandido cada vez mais.

Memes na universidade
A disciplina "Redes colaborativas e produção cultural", ministrada pelo professor Viktor Chagas no curso de Estudos de Mídia da UFF, Universidade Federal Fluminense, é destinada essencialmente a analisar memes. A ideia surgiu quando o professor deparou-se com uma matéria fake divulgada no Facebook por uma universidade de Chicago, nos EUA, sobre uma pós-graduação voltada para o estudo de memes. "Após boas risadas vi que se tratava de uma ideia genial! Foi aí que resolvi criar a disciplina", comenta Viktor.
Segundo ele, a maior dificuldade foi organizar a bibliografia do curso, tendo em vista que trata-se de um tema ainda pouco estudado. Foi preciso acessar autores dos EUA, Hungria e Indonésia para fundamentar teoricamente a disciplina. “O curso é bastante denso, a lista bibliográfica é majoritariamente em inglês, e há muita discussão a ser feita sobre viralização, contágio, e imitação social, que são temas de interesse sociológico desde o século XIX”, defende.
Memeclube (Foto: Reprodução Meme Clube)Alunos da UFF produzindo Lolcats no #Memeclube. (Foto: Reprodução Meme Clube)
Para além, Viktor criou o #Memeclube na universidade. A tentativa de explorar fenômenos da internet e associar a pesquisa acadêmica a esse objeto considerado “sem valor” que é replicado nas redes foram grandes motivadores da iniciativa. “A cultura virtual dissolve a ideia de valor ao produzir e compartilhar o trash, o grotesco e o besterol, e por isso o campo acadêmico tende a não olhar para o tema com a atenção que merece”, comenta.
O grande consumo de memes e o pouco conhecimento sobre ele fizeram com que houvesse o desejo de estruturar um clube de acesso livre aos alunos de todos os cursos que se interessassem em saber mais sobre esse fenômeno. A intenção é mostrar que os memes estão se tornando cada vez mais um campo de comunicação e conhecimento, além de uma potencial fonte de pesquisa capaz de identificar traços importantes sobre o comportamento das pessoas, seus gostos, e motivações na contemporaneidade.
Fonte: Techtudo