O que está errado no modo como a imprensa aborda a ciência

Cientista transforma pesquisa negligente em notícia reproduzida no mundo todo e põe em xeque os mecanismos de divulgação científica da mídia

Por: Carlos Orsi (Escritor e jornalista especializado em divulgação científica )

Em março deste ano, o biólogo e jornalista John Bohannon convenceu parte significativa da mídia internacional de que o consumo, em doses moderadas, de chocolate amargo aumenta a eficácia de dietas para emagrecer. Usando uma versão germanizada de seu nome, “Johannes”, ele assinou um estudo sobre o assunto, publicado em periódico científico. Divulgado por uma assessoria de imprensa, o trabalho conquistou rápida repercussão: foi destaque no jornal alemão Bild, na edição germânica da Cosmopolitan, em tabloides ingleses, em inúmeros websites e em programas de rádio e televisão dos EUA à Austrália.

E então, a virada: em maio,escrevendo para o site io9, Bohannon confessou que o estudo tinha sido concebido para gerar resultados falsos. A conclusão sobre chocolates e dietas era inválida, e um mínimo de alfabetização científica bastaria para ver isso. Mas a mídia havia engolido o press-release sem nenhum tipo de crítica ou ressalva. Como diz o texto do io9, o material oferecido era “sexy” e bem escrito. Foi o que bastou para produzir títulos como “Cientistas dizem que comer chocolate pode ajudar a perder peso” (no Irish Examiner), “Chocolate acelera perda de peso: pesquisa alega que ele baixa colesterol e melhora o sono” (no britânico Daily Express).