Mês das Mulheres: Uma luta que ainda não acabou!

Sociedade

 

Sara Ribeiro

No mês de março é comemorado o Dia Internacional da Mulher, no entanto, a história e a luta das mulheres vão além de um dia, de um mês, de um ano. No contexto histórico, a partir das lutas e movimentos promovidos, a mulher consegue aumentar gradativamente seu espaço nas esferas sociais. Apesar de possuir uma presença maior no mercado de trabalho, ainda persistem casos de desigualdade de gênero.

“As mulheres têm conseguido obter espaço na sociedade, entretanto, a maioria dos cargos de chefia ainda são ocupados por homens. Há que se considerar também a diferença salarial. Além disso, a sociedade não produz condições para que a mulher possa trabalhar e ser mãe, por exemplo”, afirma a professora e doutora em Química da UFMT/CUA, Graziele Borges.

A docente salienta que “no Brasil não há a preocupação, em forma de lei, em garantir que homens e mulheres possam ter direito a licença maternidade. Se os homens só se ausentam cinco dias pra cuidar dos filhos recém-nascidos e a guarda das crianças não é compartilhada, os homens têm muito mais condições de competir por postos de trabalho do que as mulheres”.


Março em todo o mundo é dedicado ao empoderamento feminino na busca pela igualdade, o mês da História da Mulher é celebrado desde 1911 - Imagem: Reprodução.

 

Segundo dados do relatório da Education at Glance 2019, divulgado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE); no Brasil, as mulheres têm mais probabilidade (34%) em se formar no nível superior se comparado ao gênero masculino, mas também tem menos chances de conseguir emprego.

Graziele enfatiza que “as mulheres precisam se esforçar muito mais para ocupar o mercado de trabalho. A mulher tem que se desdobrar para conseguir conciliar com outras questões, que em uma sociedade machista não afeta os homens, como o cuidado com os filhos, com a casa, com os entes mais velhos e pessoas da família que estão doentes”.

Conforme a pesquisa de Estatísticas de Gênero: indicadores sociais das mulheres no Brasil, divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2021, na população com 25 anos ou mais, 19,4% das mulheres e 15,1% dos homens, tinham nível superior completo em 2019. Apesar de ser o maior número em escala de discentes formados, isso não se traduz em maioria entre os docentes universitários. No mesmo ano as mulheres eram 46,8% do total de docentes no país.

O retrato da pesquisa mostra que por mais que a mulher seja a maior parcela com ensino superior, esse fato ainda não mudou a realidade do perfil das profissões escolhidas. A maioria estão matriculadas em cursos de serviços sociais (88,3%), saúde, excluindo medicina, (77,3%), ciências sociais e comportamentais (70,4%) e educação (65,6%).

Segundo a professora de química da UFMT, esses dados reforçam a existência de barreiras em determinadas áreas de conhecimento, “o machismo estrutural é uma questão que afeta a empregabilidade das mulheres, pois para o mercado de trabalho e para as pesquisas, são tidas como menos produtivas. E por isso, ocupam menos cargos e departamentos tidos como áreas masculinas, como nos institutos de ciências exatas e da terra”.

 

Igualdade de gênero

A acadêmica de jornalismo da UFMT/CUA, Graziela Godwin, diz que “a sociedade como um todo, é sexista, patriarcal, machista e racista. É claro que é mais fácil para o homem, aquele homem branco, estar ocupando esses espaços. Descontruir esses pensamentos foi um processo, mas ainda é muito dificultoso para a mulher entrar nesses espaços que são majoritariamente masculinos, pois ainda existe esse bloqueio de observar a capacidade da mulher em compor esses espaços”.

A importância da mulher na sociedade se faz cada vez mais intensiva na ocupação de cargos públicos e privados das mais distintas áreas. No entanto, há ainda muitos avanços a serem conquistados. “Ainda existe uma categorização do que seria um cargo para mulher e para o homem, que acorre por conta de pessoas com pensamentos retrógrados que ainda trazem muitos atrasos a sociedade”, analisa Godwin.

“No campo da ciência e da pesquisa temos o reflexo do machismo. Mulheres ainda não possuem igualdade na ocupação dessas áreas. As pesquisas de muitas mulheres não são reconhecidas, [porque] temos na realidade, homens no comando das pesquisas. Já ouvi muitas vezes de homens machistas, a frase: você trabalha muito, trabalha igual homem. Essa frase não é mencionada como um elogio (e nem seria para mim), mas são ditas para me repreender, porque na concepção dessas pessoas eu não deveria trabalhar tanto quanto um homem”, lamenta Graziele Borges.

As mulheres lutam há anos para sair das margens da sociedade, e alcançar por direito humano igualitário, o seu lugar no contexto social, a exemplo do direito ao voto, direito ao estudo, entrada no mercado de trabalho, igualdade salarial e dessa forma, vencer os conceitos machistas. 

No entanto, há reflexos da estrutura machista que ainda pairam na sociedade e emperram certos avanços do movimento feminino. É o caso do assédio sexual contra as mulheres nas relações de trabalho.

Uma pesquisa realizada pelo Tribunal Superior do Trabalho indicou que houve um aumento dos processos de assédio sexual em 21% no primeiro semestre de 2021. Com base nos dados, se constata que no período de janeiro de 2015 a julho de 2021, mais de 27,3 mil ações envolvendo a questão foram registradas nas varas do Trabalho.

O filme “Escândalo retrata fatos reais do caso que levou à demissão de Roger Ailes, CEO do canal Fox e referência no telejornalismo norte-americano, onde foi acusado em 2016 por 23 mulheres, profissionais do canal, por assédio sexual.

Ao longo do filme, o diretor dá exemplos do que a mulher enfrenta quando se depara com uma situação de assédio no ambiente de trabalho. Se ela revela, pode sofrer represálias; se não compartilha, é por conta do medo de perder o que conquistou com tanto esforço; e por fim, na maioria dos casos, a mulher se sente culpada pelas atitudes do assediador. 

No entanto, na narrativa do filme com base em “história real”, as vítimas do canal tiveram a coragem de enfrentar e de denunciar o que lhes ocorreu, afirmando que unidas é possível mudar o sistema machista.

 

Mulheres pretas

O racismo estrutural é um fator determinante nas disparidades de acesso aos setores sociais, principalmente para as mulheres negras que sofrem com o impacto das interseções das desigualdades de gênero e raça. 

“É importante fazer um recorte de raça, as mulheres brancas têm muito mais privilégios na sociedade do que as mulheres pretas, pardas e indígenas. A mulher branca, com seus privilégios, consegue ter mais conquistas em detrimento dessas outras mulheres”, aponta Graziela Godwin, estudante do curso de Jornalismo, membro do Coletivo Negro CorAge da UFMT/CUA. 

Dados do levantamento do IBGE, divulgado em 2021, revelam que a cada R$ 1,00 que o homem ganha, uma mulher branca recebe R$ 0,78 e quando se trata de uma mulher preta esse valor diminui para R$ 0,43.

Simone de Beauvoir diz que a mulher é o outro do homem, ou seja, o homem é o sujeito, a pessoa e nós mulheres somos o outro, somos invisíveis perante os homens. E eu digo mais, enquanto a mulher branca é o outro do homem, a mulher negra seria o outro do outro, ou seja, ela é mais invisibilizada ainda”, ressalta Godwin.

“Para conseguirmos alcançar a igualdade, temos que eleger aquelas pessoas que nos representam e entendam as nossas pautas. Muitas pessoas desacreditam da política, mas eu acredito que ela é uma forma de conseguirmos os nossos direitos, pois os políticos estão lá para nos representar. Devemos, além disso, ter a nossa participação de sempre estarmos engajados em movimentos sociais. Esse processo é um trabalho coletivo de empatia e de luta por nossos direitos”, finaliza Graziela.