Dsei contabiliza 21 óbitos por covid-19 entre indígenas Xavantes; presidente com a doença faz ministra cancelar visita a Barra do Garças
Saúde Indígena
Agência Focaia
Reportagem
Sara Ribeiro
Marcos Filho
Júlia Viana
A pandemia do novo coronavírus avança
rapidamente sobre as populações mais vulneráveis, entre elas as nações
indígenas. A etnia, que se distribui ao longo de 14 municípios do Mato Grosso,
vem preocupando suas lideranças, principalmente, pelas dificuldades de
isolamento e falta de acesso a produtos como álcool em gel e máscaras de
proteção. Segundo os dados do boletim do Dsei Xavante (Distrito Sanitário
Xavante), mais de 200 indígenas da comunidade já foram contaminados pela doença
e 21 óbitos já foram registrados.
Para os xavantes esses dados estão
subnotificados, a Indigenista Associada (INA) Maíra Ribeiro relata que “mesmo
com o último boletim epidemiológico de covid-19 do Distrito Sanitário Xavante,
há mais mortes e casos não confirmados.”
A Operação Amazônia Nativa (OPAN) publicou um documento com recomendações ao poder público, com o
objetivo de alertar a grave situação de saúde dos Xavantes e colaborar na
efetivação do direito à saúde indígena diferenciada. Este relatório aponta um
segmento de fatores que agravam a exposição dos xavantes ao vírus, como a precária estrutura básica de
atendimento à saúde, aspectos de sua organização sociocultural e seu perfil
epidemiológico.
A análise de vulnerabilidade
demográfica e de infraestrutura das terras indígenas à covid-19, mencionada no Caderno de Demografia Indígena, considera o território xavante como o 3º mais
vulnerável, antes mesmo de ter casos confirmados de coronavírus nessas terras
indígenas.
O
crescimento nos números de casos do coronavírus, nas aldeias xavantes, preocupa
lideranças indígenas da região. Imagem: Acervo NPD-UFMT.
Desde o agravamento dos casos, os
indígenas necessitam de ajuda, mas poucas ações chegam de fato às aldeias.
Dessa maneira, surgiu a Campanha Cidadã e Solidária em apoio às ações
emergenciais de enfrentamento do covid-19 entre o povo xavante, com o intuito
de instalar uma Unidade Avançada de Saúde próxima às aldeias xavante, além de
contribuir com atividades de prevenção do contágio e de segurança alimentar, evitando
que os indígenas saíam de suas comunidades.
“A proposta da campanha é arrecadar R$ 250
mil para a construção de uma unidade avançada de tratamento para os xavantes.
Essa campanha surgiu por conta de uma inércia do poder público. Então se o
poder público não faz, um conjunto de pessoas, de organizações não
governamentais, de movimentos sociais se juntaram no sentido de socorrer
urgentemente essa população, que está na eminência de um genocídio por conta do
avanço do covid-19”, afirma Gilson Costa, professor da UFMT/CUA.
Vulnerabilidade
indígena
Um aspecto preocupante para as
autoridades e o povo xavante é a presença de doenças como hipertensão, diabetes
e doenças respiratórias. Essas comorbidades (duas ou mais doenças simultâneas em
uma mesma pessoa) podem potencializar o agravamento do vírus nas aldeias, que,
tradicionalmente mantém grande número de indígenas em espaço comum, que pode
levar a circulação do vírus altamente contagioso.
O recomendado pelos órgãos brasileiros de saúde é para que os povos xavantes permaneçam em suas terras para que
fiquem protegidos, de acordo com Costa.
“Idealmente isso não é possível, porque
os indígenas circulam nas cidades para ter acesso a alimentação, serviços bancários, para tratar da
saúde. Precisam acessar aos mercados para a aquisição de alguns itens que eles
não produzem, por mais que o fluxo de xavantes tenha diminuído nas cidades, ele
não foi totalmente eliminado, então o risco acaba sendo alto.”
Como acrescenta o professor, o funeral
tradicional da cultura Xavante também é um aspecto sensível no contexto de
pandemia.
“O funeral xavante é um ritual bastante
complexo que segue uma tradição centenária, que envolve muitas pessoas. Existe
um esforço sendo feito para que essa tradição, pelo menos nesse tempo da
pandemia, seja mudada para proteger as pessoas envolvidas, mas essa é uma
questão muito complexa, porque você não consegue mudar uma cultura que é
centenária da noite para o dia”, explica Costa.
Ministra cancela
visita a Barra do Garças
A Ministra da Mulher, da Família e dos
Direitos Humanos, Damares Alves, estaria no município de Barra do Garças na
sexta-feira (10), a fim de avaliar assuntos relacionados a políticas públicas
de valorização das comunidades indígenas e propor campanha de fundos para a
instalação do hospital à comunidade Xavante. Contudo, a agenda foi cancelada
após o Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, testar positivo para
covid-19, na terça-feira (07).
Em comunicado, o prefeito de Barra do Garças,
Roberto Farias, informou que lamenta o acontecido, mas que compreende a
situação. No entanto, segundo ele, outra data será marcada para que a Ministra
venha ao município solucionar questões referentes aos direitos indígenas.